Maçonaria e os ConstrutoresNo Post anterior, falamos sobre a relação dos Templários com a Igreja, sobre o fato desses cavaleiros não terem sido criados pela Maçonaria, e nem da Maçonaria ter surgido dos mesmos – pois já existia na época.
Hoje vamos tratar do que, de fato, era a Maçonaria nessa época, na Idade Média, e da relação que existia com a Igreja Católica.
Em outras palavras, essa é a Maçonaria que precede a “Maçonaria Moderna”. É a Maçonaria dos Construtores da Idade Média, que é chamada de “Maçonaria Operativa”.
A nível de informação, a data de surgimento oficial da Maçonaria Moderna é o ano de 1717. Foi a partir dessa data que foi fundada a Primeira Grande Loja do mundo (que, para quem não sabe, é o órgão que regulamenta todas as Lojas Regulares do mundo). Esse foi o primeiro passo para que fosse possível regular o funcionamento da Maçonaria no mundo afora.
Após o surgimento da Maçonaria Moderna, veio a Constituição de Anderson, que apresentava a história, as obrigações e os regulamentos da Ordem, onde, com relação a história, Anderson a descrevia como uma Ordem Milenar, traçando um caminho desde Adão até chegar nos dias atuais da Ordem (passando por várias épocas).
Já falamos um pouco sobre isso no Post “Maçonaria Milenar?” – se o assunto lhe interessa, dê uma lida.
A partir daí, várias teorias passaram a surgir com relação a origem da Ordem. Essas teorias atribuíam sua origem a diversos grupos e lugares distintos. Dentre as mais curiosas, na minha opinião, podemos destacar o surgimento no Japão; na “Nova Atlântida” (de Francis Bacon); entre os Jesuítas; no Jardim do Éden; antes da criação da matéria (em um plano espiritual) e etc.
Hoje sabemos que, independente de qualquer suposta origem antiga que alguém a atribua, a Ordem surgiu da Maçonaria Operativa, que foram Construtores da Idade Média, na Europa.
Pode-se dizer que um dos primeiros estudos sobre a Maçonaria Operativa começou com um não-Maçon, o abade Philippe-André Grandidier, no final do século XVIII (1778). Ele foi o primeiro a fundamentar a sua opinião de que a Franco-Maçonaria surgiu através dos Construtores, baseando-se nos arquivos da Catedral de Estrasburgo.
Sua busca chegou até vários documentos de Estrasburgo, concluindo a natureza Operativa da Maçonaria, compreendendo que sua origem partia da mesma “instituição” que ele havia “descoberto.”
A bem da verdade, cabe ressaltar que pelo menos 28 autores, no século XVIII (e antes de Grandidier), já haviam relacionado a Ordem com construtores da Idade Média, no entanto, como elas não apresentavam fundamento sólido, elas tinham praticamente o mesmo valor que as demais teorias.
Além da importância de Grandidier, por ter descoberto esses documentos, ele nos deixou (dentre muitas outras obras históricas e arqueológicas) sua obra “Ensaios Topográficos e Históricos sobre a Catedral de Estrasburgo”, onde ele dá um resumo do Status dos “Talhadores de Pedra da Idade Média“.
Com estudos futuros, a Ordem foi tendo acesso a outros documentos que permitiram entendermos melhor o funcionamento daquela época Operativa. Os Maçons Operativos foram os grandes Construtores do passado.
Talvez você esteja se perguntando como foi possível que atribuíssem a origem da Ordem a tantas correntes de pensamento, épocas e lugares distintos?
Bem, no século XVIII, a Maçonaria já tinha a base de “moral e virtudes” pela qual a Ordem é conhecida hoje em dia. Portanto, imaginem uma Ordem de Virtudes, que presa pelo aperfeiçoamento do homem e que utiliza símbolos e alegorias que tem relação com a arte da construção. Isso abre espaço para muitas teorias.

Maçons Católicos?

Tendo pontuado essa questão, podemos passar para o ponto chave desse post.
Em vários documentos que temos registro, da Maçonaria Operativa, podemos ver como esses Maçons faziam uma declaração especificamente católica.
Nos Estatutos de Ratisbonne (XV), nós já podemos ver como esses Maçons lidavam com a questão religiosa-católica na instituição. Ele começava da seguinte maneira:
“Em nome do Pai, do Filho, do Espírito Santo, da bem-aventurada Virgem Maria, e também de seus bem-aventurados Servidores, os Quatro Santos Coroados, em sua memória eterna”.
Durante o texto ele fala sobre a obrigatoriedade de se confessar e comungar, pelo menos uma vez ao ano… também afirma que “os mestres e os artistas devem considerar justo que Deus Todo Poderoso os receba graças a Arte e ao Trabalho de construção, das edificações divinas e das obras admiráveis (…) e que seus corações sejam tocados de gratidão cristã, a fim de promover o serviço divino, e ganhar a salvação de sua alma”.
Em outro documento, conhecido como “A Carta de Bolonha” (considerado o documento mais antigo da Ordem) podemos encontrar essa referência católica no juramento…
“Eu, mestre da madeira e do muro que sou, ou serei, da sociedade de ditos mestres, juro, em honra à nosso Senhor Jesus Cristo, à Bem-Aventurada Virgem Maria e a todos os santos, e em honra ao podestade e capitão que é agora ou serão no futuro, e para a honra e bem estar da cidade de Bolonha…”
Nos Manuscrito Cooke (1430) encontramos essa referência logo no começo…
“Damos graças a Deus, nosso glorioso Pai, Criador do Céu e da Terra e tudo o que nela está e que ele conhece [em virtude] de sua Gloriosa Divindade.
Ele fez todas as coisas para ser obedecido, e muitas delas em benefício da humanidade, lhes ordenou submeterem-se ao homem, porque todas as coisas que são comestíveis e de boa qualidade [servem] para o sustento do homem.”
Caso não tenha ficado claro que essa última citação se trata de uma referência católica, é importante se atentar para o “nosso glorioso Pai, criador do céu e da terra”.
Essa assertiva é apresentada pela igreja em seu Credo de Nicéia, e sua importância é bem maior do que  maioria das pessoas imaginam.
O que a Igreja representava com isso era a ideia de um único Deus, criador de tudo e de todos, demonstrando que ela não admite outros deuses, nem outras “causas e efeitos” que não o Deus único.

Os Livres Construtores

No mais, devido ao trabalho que os Maçons realizavam nessa época (e já declarando sua natureza cristã) eles passaram a ter, graças a Igreja, um “passe livre” pela Europa, já que a demanda de construções era muito grande e não haviam construtores suficientes para a realização de todos os empreendimentos.
Graças a alguns papas da época eles estavam liberados dos estatutos locais, dos decretos reais e de qualquer outra obrigação imposta aos habitantes dos países onde eles estivessem residindo, ficando assim acima das leis do Estado e estando sob a proteção da Igreja. Podiam transpor as fronteiras livremente, tanto em tempos de paz como em tempos de guerra.
Cabe lembrar que nem todos os construtores da época eram membros da ordem que hoje chamamos de Maçonaria Operativa.
Podemos ver, já em 1350, em um Ato do Parlamento Inglês, do reino de Eduardo III, a denominação de franco-maçon, no caso “free-stone-mason”, que era o Maçon livre que trabalhava a pedra ornamental, distinguindo-os assim dos “rough-mason”, denominação dada aos trabalhadores rudes (normalmente os escavadores ingleses).
Esses Franco-Maçons tinham seus sinais secretos, seus símbolos e um procedimento ritualístico. Inclusive, alguns dos procedimentos de iniciação foram preservados até os dias de hoje.
Para finalizar, no post sobre os Templários eu apresentei uma pergunta que muitos fazem, com relação a Igreja e a Maçonaria, que é: “Como a Igreja, que apoiava os Templários, veio a condenar a Maçonaria, séculos depois??”
No próprio Post já ficou claro o porque da pergunta não fazer sentido (já que os Templários não eram a Maçonaria), no entanto, uma pergunta parecida pode ser feita agora:
“Como a Igreja, que apoiava a Maçonaria Operativa, veio a condenar a Maçonaria Moderna, séculos depois??”